O movimento indígena decidiu iniciar protestos contra o Governo Lula (PT), sobretudo pela falta de demarcação de terras indígenas, e o Supremo Tribunal Federal Federal (STF), que deve iniciar o processo de conciliação sobre o Marco Temporal em agosto.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que reúne as principais organizações dos povos no Brasil, realizou uma assembleia extraordinária nessa segunda-feira, 8, para tratar do tema. Lideranças mudaram sua postura com relação à gestão petista, após meses de crescente insatisfação.
Os atos devem começar nesta quarta, 10. Parte do movimento já deixou de apoiar a gestão petista —em que pese outra ala entender que ainda não é momento para isso— e, sob reserva, lideranças reclamam que o Planalto não atua em prol desta pauta.
A posição de consenso, por enquanto, ainda é de se manterem aliados à ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, que é ex-coordenadora executiva da Apib.
O ministro do STF, Gilmar Mendes, marcou para agosto o início do processo de conciliação sobre a lei do marco temporal. Paralelamente, está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, na quarta, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata do tema.
A decisão é o ápice de uma crescente insatisfação do movimento com o governo, que passa principalmente pela não demarcação de terras indígenas.
Como mostrou a Folha, Lula contrariou documentos do próprio governo quando, em abril, recuou e não demarcou dois quatro territórios que estavam prontos para isso.
Segundo pareceres jurídicos internos, não havia impedimento para a homologação dessas terras, ao contrário do que afirmam o petista e seus ministros desde então.
A lei do marco temporal, outra das justificativas públicas para a decisão, também não seria obstáculo para as demarcações, de acordo com um entendimento conjunto da Casa Civil, da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria-Geral da União e dos ministérios da Justiça e dos Povos Indígenas.
A insatisfação do movimento indígena com o governo federal, no entanto, é uma longa crescente, que também inclui críticas a não efetivação de políticas públicas voltadas à proteção dos povos.
Em abril de 2023, Lula foi convidado para participar do ATL (Acampamento Terra Livre, principal ato anual do movimento indígena), e havia a expectativa que ele anunciasse 14 novas demarcações de terras indígenas.
Esta lista foi criada durante a transição de governo, quando a equipe compilou os territórios que não teriam impedimento jurídico para que fossem homologados.
No evento, no entanto, Lula anunciou apenas seis —as outras passaram então por novas análises internas.
A promessa do governo era que toda a lista seria demarcada até o final daquele ano, o que também não aconteceu.
Em abril deste ano, ainda com seis terras pendentes para homologação, a Apib não convidou o presidente para participar do ATL.
Paralelamente, o governo organizou um evento para anunciar as seis demarcações que restavam —de última hora, o Planalto recuou em quatro delas, e oficializou duas.
O recuo surpreendeu autoridades, que foram avisadas da decisão no mesmo dia do evento, horas antes de seu início, e também lideranças indígenas, que cogitaram boicotar o discurso de Lula.
Procurada pela Folha, à época, a Casa Civil afirmou que, “por cautela”, optou por “agir com maior segurança social e jurídica”.
A reportagem questionou quais seriam os processos que impediram as demarcações naquele evento.
A pasta citou, especificamente, a decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que suspendeu todos os processos sobre a constitucionalidade da lei que estabeleceu o marco temporal —tese segundo a qual as demarcações devem respeitar os territórios ocupados em 1988, data da Constituição.
A determinação do ministro aconteceu em 22 de abril. O recuo de Lula, porém, foi na semana anterior, no dia 18.
E pelo menos desde março já havia o entendimento, construído em reuniões com a própria Casa Civil, de que o marco temporal não teria impacto sobre esses seis territórios.
Essa posição, aliás, consta em pareceres dentro dos processos de demarcação, aos quais a Folha teve acesso.
Os documentos mostram que, após a sanção da lei do marco temporal, no fim de 2023, foi feita nova avaliação das homologações, para averiguar os possíveis impactos desta legislação nessas terras.
Todos os pareceres concluem que o marco não atinge tais demarcações.
Após suspender os processos sobre o marco temporal, Gilmar Mendes marcou para agosto o processo de conciliação a respeito do reconhecimento, demarcação e uso das terras indígenas no país.
A tese do marco temporal é defendida pela bancada ruralista. Segundo ela, os territórios dos povos devem considerar a ocupação na data da promulgação da Constituição Federal.
O movimento indígena a avalia como inconstitucional, sob argumento de que o direito às terras é anterior à criação do Estado brasileiro e, portanto, não pode estar restrito a um ponto temporal e, sim, deve ser determinado por meio de estudos antropológicos.
Lideranças também criticam a ideia de conciliação proposta por Gilmar Mendes —que defende a tese do marco.
Eles entendem que os direitos dos povos são direitos fundamentais, ou seja, não há como existir um processo de conciliação. Também afirmam que o STF se contradiz, pois em 2023 julgou e derrubou a tese do marco temporal, por decisão da maioria do plenário.
O governo Lula também é alvo de protestos dos servidores ambientais, que iniciaram uma greve em junho deste ano, reivindicando melhores condições de trabalho e reajuste salarial.
Da Agência Cenarium
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