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Mudança na Petrobras coloca em risco R$ 40 bi de investimento de ‘junior oils’

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Abertura de capital na Bolsa. Aquisição de empresas rivais com atuação regional. E expectativa de triplicar a produção nos próximos anos. É assim que as companhias independentes de petróleo e gás querem ampliar a atuação Brasil afora com investimentos planejados de R$ 40 bilhões até 2029.

Chamadas de junior oils, as projeções indicam a geração de mais de 300 mil postos de trabalho com o desenvolvimento de áreas de exploração no interior das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste, de acordo com a Abpip, a associação do setor.

Mas a euforia, que começou a ganhar forma em 2015, quando a Petrobras anunciou planos de vender campos de petróleo em terra, esbarra em desafios, segundo empresas e especialistas. No início do mês, a estatal suspendeu a venda de ativos (que incluem campos em terra e águas rasas) por 90 dias a pedido do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que pretende reavaliar a Política Energética Nacional.

O mercado de petroleiras independentes, porém, ganhou fôlego explorando áreas que não eram atraentes para a Petrobras, mas que representam uma oportunidade de investimento para o setor privado.

A taxação de exportações de petróleo também é vista com preocupação por especialistas, que avaliam que isso pode aumentar a insegurança jurídica e afastar investidores.

Em caráter imediato, há, segundo cálculos do GLOBO, ao menos R$ 5,8 bilhões em investimentos na berlinda com a postergação da venda pela Petrobras de três polos em terra em Bahia, Espírito Santo e Rio Grande do Norte, levando em conta as expectativas de aporte de empresas como PetroReconcavo, Seacrest e 3R.

Fusões e aquisições em alta

Para Anabal Santos Junior, secretário executivo da Abpip, as empresas independentes estão em fase de desenvolvimento após a primeira leva de aquisições de ativos da Petrobras. Muitas estão, afirma ele, desenvolvendo novas áreas de petróleo para aumentar suas reservas. A projeção é que a produção das companhias passe dos atuais 225 mil barris diários para 500 mil em 2029.

— Há uma perspectiva de R$ 40 bilhões em investimentos. As companhias estão ampliando suas atividades para além do que tinha a Petrobras. Isso vem gerando grande quantidade de empregos e contratação de empresas do setor, estimulando toda a cadeia, mas podemos perder parte desse crescimento se a Petrobras decidir não vender seus ativos — afirma Junior.

Há ainda o movimento de fusões e aquisições entre as junior oils. Fontes do setor apontam que há 15 operações em andamento. A mais recente ocorreu em fevereiro, quando a PetroReconcavo, que abriu capital na Bolsa em 2021, comprou a Maha Energy, com áreas na Bahia e em Sergipe. A companhia espera, agora, resposta da Petrobras para comprar o Polo Bahia da estatal.

Para Marcio Félix, CEO da EnP Energy Platform, que reúne diversos ativos de petróleo, o setor vive uma nova fase de desenvolvimento com as companhias buscando ativos. Ele cita os leilões da oferta permanente da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

Na EnP, a meta é investir R$ 100 milhões a partir de 2024. Félix destaca que podem ser gerados até mil empregos com as novas operações no Espírito Santo e na Bahia. Há duas semanas, a empresa declarou a comercialidade do Campo de Batuira, no Espírito Santo. A meta é triplicar a produção em três anos:

— O cenário de crescimento é irreversível, mas é fundamental para o sucesso das empresas independentes e de seus efeitos positivos na economia brasileira que a Petrobras conclua o processo de venda das operações em curso.

Quem também acelera os planos de investimento é a Origem Energia, com campos em Alagoas, Bahia, Espírito Santo e Rio Grande do Norte. Segundo o CEO da empresa, Luiz Felipe Coutinho, o plano é investir US$ 300 milhões nos próximos cinco anos, dos quais US$ 130 milhões irão em 2023 para Alagoas .

—Estamos revitalizando todo o polo de Alagoas. Vamos desenvolver projeto para estocar o gás de terceiros e criar uma empresa independente. O gás precisa ser vendido como solução de energia e não apenas olhar para a molécula — diz Coutinho.

A Origem vai ampliar investimentos nos campos na Bahia, no Rio Grande do Norte e no Espírito Santo. Vai ainda elevar o quadro de funcionários, que hoje somam mil pessoas, entre 5% e 10% neste ano. E tem planos de abrir capital.

As empresas independentes estão crescendo em direção ao mar, dizem especialistas. A Enauta, uma das únicas brasileiras independentes a operar em águas ultraprofundas no país, investe US$ 1,2 bilhão no desenvolvimento do Campo de Atlanta, no pós-sal da Bacia de Santos, cujo primeiro óleo está previsto para meados de 2024. Segundo Décio Oddone, presidente da companhia, o objetivo é construir um portfólio diversificado:

—Continuamos avaliando oportunidades de aquisição de ativos para ganhar escala e competitividade, entrando num ciclo de crescimento.

Quem tem ampliado investimentos é a Seacrest, que opera no Espírito Santo e, em fevereiro, levantou US$ 260 milhões com abertura de capital na Bolsa de Oslo, na Noruega. Parte dos recursos será usada para pagar pelo Polo Norte Capixaba da Petrobras, que está em compasso de espera.

Suspensão de venda e taxação de exportação trazem insegurança

Os desafios para as empresas independentes vão além da suspensão da venda de ativos da Petrobras. Na pauta de preocupações está a tributação temporária para exportações de petróleo, anunciada recentemente pelo governo.

Segundo Giovani Loss, sócio do escritório Mattos Filho, são medidas que trazem insegurança jurídica aos investidores para um setor que responde por 15% do PIB (soma de bens e serviços produzidos no país):

—Foram duas iniciativas que trazem insegurança.

Muitas empresas, que tinham acordos de compra já assinados com a Petrobras, se queixam de que as reuniões de acompanhamento foram suspensas sem remarcação. A estatal disse em comunicado ao mercado que o Ministério de Minas e Energia solicitou a suspensão das alienações de ativos por 90 dias, para reavaliação da Política Energética.

Mas a lista de demandas vai além. Anabal Santos Junior, secretário executivo da Abpip, diz que é preciso avançar na debate de mudanças de royalties para companhias que operam em campos de baixa produção e atualizar a classificação das empresas de pequeno e médio porte.

—O crescimento das empresas independentes vem exigindo modernização constante da regulação de forma a permitir o desenvolvimento das atividades em áreas carentes de investimento.