O governo recuou da decisão sobre a tributação de compras de importados na internet. Essa medida, que não foi formalizada, gerou forte reação nas redes sociais e críticas por eventual impacto no bolso do consumidor. O ministério da Fazenda voltou atrás a pedido do presidente Lula.
A intenção era acabar com a regra que isenta de impostos as remessas internacionais com valor inferior a US$ 50 (cerca de R$ 250). O benefício é exclusivo para pessoas físicas. Portanto, não poderia ser usado por empresas.
— O presidente nos pediu ontem para tentar resolver isso do ponto de vista administrativo, ou seja, reforçar a fiscalização, sem a necessidade de mudar a regra atual. Havia confusão de que a mudança poderia prejudicar as pessoas que de boa fé recebem encomendas do exterior até esse patamar — disse o ministro.
Ao buscar a resolução do problema do “ponto de vista administativo”, ou seja, com regras internas da Receita Federal, não haverá a necessidade de editar uma medida provisória. Veja como funciona:
- Hoje, as compras feitas em comércio eletrônico devem ser tributadas em 60% (imposto de importação). Independente do valor.
- A isenção de encomendas abaixo de US$ 50 só vale para repasses entre pessoas físicas. Ou seja, dois consumidores em diferentes países. A regra de isenção não vale para as vendas de empresas para pessoas físicas.
- Algumas práticas irregulares seriam entregas fragmentadas (para uma mesma pessoa) para ficarem abaixo do teto de US$ 50 e simularem repasses entre pessoas físicas.
- Auditores da Receita Federal também suspeitam que alguns vendedores estariam fornecendo informações falsas para sonegar tributos, como declarar o bem por valor inferior, ficando dentro do limite de US$ 50.
- A identificação de quem compra e quem vende atualmente é feita por amostragem. Por isso, muitas vezes, essa taxação acaba não acontecendo.
- A Fazenda queria “fechar a torneira” e acabar com esse benefício, alegando que o repasse entre pessoas físicas é “inexpressivo”.
- A pedido do presidente Lula, o ministério voltou atrás e vai focar unicamente em novos protocolos de fiscalização para evitar evasão fiscal.
A decisão do presidente ocorreu na última segunda-feira. Desde então, a Fazenda está estudando exemplos de práticas internacionais para definir quais mudanças no processo de fiscalização serão empregadas e assim impedir que empresas usem brechas na legislação.
Na previsão anterior, a principal via de fiscalização anunciada pela Fazenda seria obrigar o exportador a prestar declarações antecipadas com dados do produto. Uma instrução normativa da Receita, com validade a partir de julho de 2023, já prevê o repasse de até 37 informações ao Fisco, antes da chegada das encomendas no Brasil.
— Vamos ver do ponto de vista prático como coibir essa irregularidade (…) A maioria das empresas respeita a Lei e essas empresas precisam ser ouvidas na regulação — afirmou Haddad.
A Receita entendia que acabar com a isenção para compras de até US$ 50 seria a medida mais eficiente para combater eventual sonegação de impostos de plataformas digitais como as asiáticas Shopee, Shein e AliExpress, entre outras. Esses e-commerces vendem produtos importados no Brasil pela internet e despontam como um grande sucesso, incomodando empresas nacionais.
Sem detalhar, o ministro alega que “uma grande empresa” estaria concentrando a maior parte da evasão fiscal. Ainda segundo Haddad, a Fazenda foi procurada pela Aliexpress e Shopee, que concordaram com aumento no processo de fiscalização. Ele diz que Shein não procurou a Fazenda.
Receita R$ 8 bilhões
O ministério da Fazenda diz que a perda de arrecadação, com as empresas que não pagam impostos no comércio eletrônico, é de R$ 7 bilhões a R$ 8 bilhões por ano. O número é preliminar e associações do setor de varejo brasileiro estimam um valor potencialmente maior.
Haddad reconhece que sem o fim da isenção de remessas de US$ 50 haverá dificuldades na fiscalização da Receita Federal, com o grande volume de remessas internacionais que chegam no Brasil. A estimativa de arrecadação em até R$ 8 bi, portanto, pode ser menor.
— Não será fácil. Uma coisa é fechar a porta, outra é um caminho mais árduo [focar na fiscalização apenas]. A estimativa de arrecadação vai depender do grupo de estudo que foi formado hoje para averiguar o que acontece na Europa, EUA e China para coibir a fraude. Nós entendemos que vamos conseguir, vamos precisar de um pouco mais de tempo.
De O Globo
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